O trato digestivo abriga um número enorme de microrganismos, incluindo bactérias, fungos e vírus. Para se ter ideia da sua importância, o número de células destes microrganismos é maior que o número total de células do nosso corpo! As partes mais proximais do trato digestivo, como o estômago, duodeno e jejuno, têm uma flora mais discreta devido a ação suco gástrico ácido. Os microrganismos presentes nesta região são portanto os mais ácido-resistentes, como o Helicobacter pylori e os lactobacilos. Por outro lado, o íleo (porção mais distal do intestino delgado) e o intestino grosso têm uma quantidade muito maior destes organismos.
A flora intestinal desempenha várias funções, como formação de uma barreira contra organismos patogênicos invasores, regulação da função motora e imunológica, digestão de alimentos, produção de vitaminas, regulação da absorção e transporte de nutrientes e água pelas células do intestino, desintoxicação de substâncias agressoras e, principalmente, manter o equilíbrio geral do trato digestivo. Obviamente não podemos banalizar tantas funções! Manter a flora intestinal saudável, o que chamamos de “eubiose”, é essencial para que mantenhamos a nossa saúde.
Então podemos dizer que quanto mais bactérias tivermos em nosso intestino mais saudáveis seremos? A resposta é NÃO! Precisamos ter uma população de microrganismos no intestino de boa qualidade e nos segmentos intestinais corretos. Caso contrário, teremos uma alteração da flora chamada “disbiose”. Um exemplo muito importante de disbiose é o “Supercrescimento Bacteriano do Intestino Delgado” (SIBO – Small Intestinal Bacterial Overgrowth), que está presente em uma série de doenças e alterações.
A SIBO se caracteriza pelo crescimento anormal de bactérias no intestino delgado, região onde estas bactérias não seriam esperadas em grande número. Esta alteração está presente em pacientes com doença celíaca, síndrome do intestino irritável, doenças inflamatórias intestinais (doença de Crohn), cirurgias gástricas e intestinais, uso crônico e exagerado de medicamentos para o estômago, diabetes, intolerância à lactose, cirrose hepática, esteatose hepática não-alcoólica e pancreatite crônica.
Os sintomas decorrentes da SIBO podem advir da má absorção de nutrientes pelo trato digestivo, do aumento da permeabilidade da mucosa intestinal, dos efeitos inflamatórios causados no intestino e da ativação da imunidade intestinal. Desta forma, as queixas mais comuns são aumento de gases intestinais e flatulência, distensão e dores abdominais, diarreia, esteatorreia (gordura nas fezes) e fezes mais “pálidas”. Em relação aos aspectos nutricionais pode haver anemia (má absorção de ferro e vitamina B12), baixo crescimento em crianças e perda de peso. Os sintomas do SIBO tendem a ser crônicas, durando meses ou anos, e com flutuação na intensidade.
O diagnóstico é feito através de teste respiratório em que se analisam os gases expirados após a ingestão de lactulose. Caso a quantidade destes gases ultrapassem certos limites, isto significa que houve a fermentação exagera, o que é causado pelo excesso de bactérias no intestino.
O tratamento da SIBO consiste em usar antibióticos com o objetivo de restabelecer a flora intestinal normal, mas probióticos também são citados. Mas como a SIBO costuma ser uma consequência a outras alterações, é preciso também tratar e controlar as doenças e medicamentos que podem ter gerado o supercrescimento de bactérias. E nos casos com deficiências nutricionais, estas precisam ser tratadas.
Dr. Fernando Valério
Gastroenterologia e Nutrologia
Especialista em Doença Celíaca e Doenças Intestinais Funcionais
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