A nutrição e a sua importância em pacientes com câncer

O câncer é uma doença que se caracteriza pelo crescimento desordenado e invasivo de células do nosso corpo. Obviamente esta é uma informação técnica e fria sobre uma doença, mas que na prática traz uma série de dúvidas, angústias e sofrimento para aqueles que sofrem com a doença e de seus familiares. Como uma doença complexa e grave, com tratamentos e terapias agressivas, e com consequências físicas e emocionais enormes, pensar em todos os aspectos é muito importante.

Atendo em meu consultório pacientes com câncer e claramente percebo que um destes aspectos é algumas vezes negligenciado durante o processo de diagnóstico e tratamento. O aspecto nutricional! A razão para isto é que após o diagnóstico os pacientes são submetidos a inúmeros exames para estadiamento e acompanhamento da doença, cirurgias, quimioterapia e radioterapia, o que torna a sua vida tão intensa e atribulada, que é realmente difícil se pensar em todos os detalhes. Mas os aspectos alimentares e nutricionais não podem ser esquecidos. A má nutrição é um problema comum em pacientes com câncer e tem sido reconhecida como um efeito adverso importante da doença, já que aumenta a morbidade e mortalidade, além de causar um prejuízo à qualidade de vida. Mais do que isso, a perda de peso causada pela doença é um indicador de pior prognóstico em pacientes com câncer. Saibam que 80% dos pacientes com câncer digestivo e 60% dos pacientes com câncer de pulmão já se apresentam com perda significativa de peso (mais de 10% do peso em 6 meses) no momento do diagnóstico. Por isso, todo paciente com câncer deve ter a sua parte nutricional avaliada e estudada por um especialista capacitado em nutrição e que entenda a complexidade dos cuidados de um paciente com câncer.

As alterações que mais impactam nutricionalmente os pacientes com câncer são aquelas que impedem a ingestão oral dos alimentos. São elas a anorexia, náusea, vômitos, saciedade precoce, diarreia, constipação, estomatite (inflamação da mucosa da boca), mucosite (inflamação da mucosa digestiva), disfagia (distúrbio de deglutição), perda de paladar e olfato, dor, fadiga, ansiedade e depressão. Apesar da perda de peso estar comumente relacionada à evolução natural do câncer, muitas vezes o primeiro aspecto afetado no momento do diagnóstico é o emocional. Após o diagnóstico já há uma diminuição da ingestão alimentar adequada por parte do paciente pelo fato de se perceber que uma doença grave o acometeu. Todas estas alterações descritas acabam culminando com um déficit de ingestão ou de absorção de macronutrientes (carboidratos, proteínas, e gorduras) necessárias para manter repor os gastos metabólicos relacionados à doença e ao tratamento instituído. A anorexia também é um efeito colateral importante da doença e do tratamento, atingindo de 15 a 25% dos pacientes. Nos casos mais avançados, quando há a presença de metástases, a anorexia está presente em praticamente todos os pacientes.

Boas práticas de alimentação ajudam a manter os pacientes com câncer com o peso ideal, previne e repõem deficiências nutricionais, melhoram a qualidade de vida, possibilitam uma vida mais ativa e produtiva, preservam a massa magra do corpo, ajudam a suportar melhor os tratamentos, colaboram na cicatrização de órgãos e tecidos afetados com o tratamento e diminuem as chances de recidiva da doença. Práticas inadequadas de nutrição nestes pacientes podem contribuir com a incidência e severidade dos efeitos colaterais dos tratamentos (cirurgia e quimioterapia), prejudicam a imunidade e aumentam os riscos de infecção, diminuindo as chances de sobrevivência. Nos indivíduos com tumores malignos avançados, infelizmente o objetivo da abordagem nutricional não é mais preservar o peso ou reverter a má nutrição, mas sim oferecer maior conforto e alívio dos sintomas.

Pessoas diagnosticadas com câncer devem ser estimuladas a manter os hábitos mais saudáveis possíveis para este momento de turbulência, como a alimentação e a prática de alguma atividade física compatível com o momento. Mas há um cuidado que deve ser sempre lembrado. Não há solução mágica, comidas milagrosas e descobertas fantásticas de um dia para o outro. É preciso sobriedade e respaldo científico em toda a abordagem do paciente, desde a sua avaliação até a intervenção alimentar. Estes cuidados com tudo o que é oferecido ao paciente podem sim ser relevantes para a sua cura e manutenção da qualidade de vida. A busca por medidas não estudadas devidamente podem fazer com que um momento importante do tratamento seja perdido, ou pior, que esta abordagem alimentar equivocada seja até mesmo prejudicial.

Por tudo o que descrevi em relação aos benefícios destes cuidados, sugiro que pacientes em que iniciarão o seu tratamento de câncer, que já estão se tratando, e que já terminaram o seu tratamento, podem e devem ser avaliados, orientados e acompanhados em relação aos seus aspectos nutricionais e hábitos alimentares.

 

 

Dados do autor:
Dr. Fernando Valério
Gastroenterologista, Nutrólogo e Proctologista
São Paulo, SP
Consultas: particulares e Omint

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Dr. Fernando Valério