Em dezembro de 2006 publiquei neste Blog um artigo intitulado “Informações médicas e Internet” (recomendo a leitura), que mostrava às pessoas como se informarem sobre assuntos de saúde em sites médicos, até que ponto chegar com as informações adquiridas, entender que o médico ainda deve ser o responsável pelos diagnósticos e tratamentos instituídos, principalmente devido a complexidade e enormidade de informações que devem ser analisadas. Na última semana a Revista Época publicou uma reportagem de capa que retratava este tema, e a denominou “Dr. Google”. A reportagem também chamou a atenção para o fato de que a Internet está mudando, e muito, o tipo de relacionamento que os pacientes tem com os seus médicos. Neste artigo tenho como objetivo retratar a minha experiência e opinião sobre este assunto.
Imagine que você tenha a intenção de comprar um carro. Caso você entenda muito sobre mecânica, com certeza o vendedor terá que se dedicar muito para convencê-lo a adquirir o automóvel. No entanto, caso você não tenha qualquer preparo neste assunto, você estará sempre a mercê da simpatia e do carisma deste funcionário, independente do real conhecimento sobre carros que ele possa ter. Isto é o que acontece quando você vai ao médico, e este profissional percebe o seu total desconhecimento. Neste momento, dependendo da qualificação e responsabilidade do médico que o atende, a sua consulta pode se transformar em um julgamento, algo ditatorial e sem direito a réplicas. Durante anos, muitos médicos se aproveitaram deste tipo de despreparo, e até utilizavam frases como: “você não precisa entender isto, eu sou o médico e você o paciente”. Felizmente, a Internet vem destruindo este tipo de comportamento, e mais do que isso, vem penalizando os médicos que têm esta prática, com uma diminuição clara em seu número de consultas.
Atualmente os pacientes chegam ao consultório com informações previamente adquiridas, com noções muito boas de métodos diagnósticos e tratamentos. Às vezes, trazem dados muito interessantes e pertinentes aos seus casos, o que torna a consulta muito atrativa para mim e para eles. Na verdade, as minhas consultas mais produtivas são aquelas em que os pacientes vêm “armados” de desafios e questionamentos, fazendo com que eu aprofunde mais ainda sobre as teorias e conhecimentos que expliquem cada sintoma, a indicação de cada exame solicitado e, principalmente, sobre os tratamentos que serão instituídos. Por sinal, cerca de 85% das pessoas procuram na Internet a comprovação do que foi dito na consulta realizada. Ou seja, os médicos devem estar preparados e dispostos para prestarem um atendimento exemplar, porque em questão de horas a “mácara pode cair”.
Outra revolução importante acontecerá no tempo de consulta. É simplesmente impossível responder a todas as dúvidas geradas por tanto conhecimento prévio em 15 minutos de consulta. Sendo assim, todos os médicos deverão se preparar para uma grande discussão médica em cada consulta, tendo a certeza que hoje quem termina a consulta é o paciente, e não o médico. No meu consultório sempre tive esta preocupação, o que é demonstrado com didática específica aos pacientes, com desenhos realizados no momento do atendimento, além da exposição de figuras, tabelas e organogramas digitalizados sobre várias doenças. Esta é uma das razões pelas quais sei que os meus pacientes seguem de forma rígida o que é orientado, às vezes alterando de forma radical os seus estilos de vida. Este é um dos pontos mais positivos da conquista do conhecimento médico por parte dos pacientes: quem entende o que está acontecendo é mais capaz de seguir e perseverar em seus tratamentos, por mais áridos que eles possam parecer.
Como mostrou o jornalista Thomas Friedman no livro o “O mundo é plano”, estamos estreitando as distâncias de conhecimento em várias áreas da ciência, e cada vez mais seremos capazes de discutir sobre vários assuntos, mesmo que não sejamos especialistas neles. Aos pacientes, utilizem o seu preparo para cobrar um atendimento condizente com o que já foi lido. Aos médicos, estudem, já que o diploma pendurado na parede poderá não passar de um enfeite caso esta revolução seja banalizada por vocês. Preparem-se para responder a muitas perguntas.
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